UnB Agência – E Opep verde (ou Opep do etanol), como foi concebida inicialmente, seria de grande ajuda para o Brasil, já que nosso problema é a falta de investimentos?
Vidal – Sim. Com a dívida enorme que temos, falta dinheiro para investir. Temos de aumentar a produção, criar uma rede de distribuição, construir bases de recepção em outros países, e isso custa caro. Com a Opep Verde, o problema fica superado, porque outros países vão investir como nossos sócios, mas sob o nosso comando, porque temos o solo. Por mais que pareça contraditório, os produtores de petróleo no Oriente Médio também têm interesse em ajudar na produção de etanol, para diminuir a tensão e os conflitos em seu território.
UnB Agência – Na semana passada, foi criado o Fórum Internacional de Biocombustíveis, que tem a participação de Brasil e Estados Unidos. Esse é considerado um primeiro passo para transformar essas fontes renováveis, como o álcool, em commodity internacional. Que mudanças isso traz?
Vidal – Commodity é o símbolo do livre mercado, onde os preços são manipulados e vale tudo. O que vai ocorrer é que os americanos, que não querem mexer na sobretaxa do álcool, vão estipular os preços para que os seus produtores não percam dinheiro. De saída, sabemos que os preços vão duplicar, já que o álcool produzido nos Estados Unidos custa o dobro do preço. Será totalmente prejudicial para o Brasil.
UnB Agência – O senhor implementou o Programa Nacional do Álcool no Brasil na década de 1970. Foi um investimento a longo prazo, tendo em vista um colapso do petróleo no futuro?
Vidal – Quando fui convidado pelo então ministro da Indústria e Comércio Severo Gomes para ser o secretário de Tecnologia Industrial do Brasil, montei uma equipe dos melhores centros tecnológicos e universidades brasileiras para fazer uma avaliação do potencial brasileiro de ser a grande potência de energia líquida. Ficou claro na época o inevitável colapso do petróleo e o grande potencial de liderança do Brasil na área. Verificamos que o Brasil possuia 20% de capacidade ociosa, ou seja, se produzia mais do que se vendia. Fizemos outros estudos que mostraram a viabilidade de misturar até 20% de álcool anidro na gasolina, sem nenhuma alteração no motor. Lançamos então o programa de mistura do álcool na gasolina. E depois, desenvolvemos pesquisas para usar 100% de álcool no motor. O Pró-álcool teve um sucesso enorme e chegamos a substituir 96% dos carros a gasolina por carros a álcool.
UnB Agência – O senhor tem criticado muito a Política Nacional do Biodiesel. Mas ela também não é uma importante alternativa ao combustível não-renovável?
Vidal – Não aprovo a forma como o governo tem levado essa questão. Pelas minhas críticas, já fui chamado pelo presidente Lula para conversar sobre o que pode ser melhorado. Disse a ele que o Brasil está despreparado para assumir a posição de liderança porque estamos atendendo a interesses da indústria automobilística internacional, e não aos nossos interesses. O produtor rural brasileiro tem todo potencial para produzir óleo vegetal a partir do girassol, da mamona, do dendê. Só que esse óleo não serve para os motores dos carros da Mercedez Benz, por exemplo, pois não conseguem queimar a glicerina presente no óleo. É preciso então produzir o biodiesel, que é o óleo vegetal sem glicerina. Mas essa tecnologia já não é dominada pelos nossos pequenos produtores.
UnB Agência – Mas há a possibilidade de aproveitar o óleo vegetal como combustível sem transformá-lo em biodiesel?
Vidal – Na Alemanha, foi criada uma tecnologia de motores que queimam o óleo vegetal in natura, sem tirar a glicerina. Mas parece que o interesse não é usar o nosso combustível, mas adaptar esse combustível às conveniências tecnológicas da Mercedez. E isso complica tudo. A lei brasileira obriga a introduzir apenas 2% de mistura óleo vegetal no óleo diesel. É uma mixaria, já que poderíamos utilizar 100% de óleo vegetal. Mas, na conversa que tive com o presidente, surgiu a idéia de criar uma empresa de economia mista responsável pela área dos biocombustíveis, como uma Petrobras dos renováveis. Se for implementada, talvez ajude a alavancar o programa dos biocombustíveis no país.
Por: Cláudio Reis/UnB Agência – Isabel Fleck – Portal da UNB
Leave a Reply